quarta-feira, julho 09, 2008

Vinhos Nacionais às Cegas

No dia 16/06/2008 esteve a meu encargo realizar degustação de vinhos nacionais para a confraria Bacco Ubriaco. Optei por fazer às cegas afim de evitar influência dos preconceitos em relação aos vinhos nacionais. Na verdade, o objetivo também era avaliar o preconceito em si e coloquei um vinho surpresa estrangeiro e renomado no evento.
De fato, houve certa confusão entre os confrades. Alguém desconfiou que eu tinha armado alguma cilada, mas diante de minha frieza de jogador de poker deixou por isso mesmo. Outro, não lidou bem com a boa nota que acabou concedendo ao Montes Alpha Cabernet Sauvignon 2005 e recuou em revelá-la achando que estava alta demais.
Um terceiro, por fim, confessou que não passaria de 85 pontos por princípio para um nacional, após ser revelado que estava tomando um Montes Alpha.
Mesmo às cegas, só de se saber que eram vinhos brasileiros, um Montes Alpha que é 89 na Wine Spectator (e em minha opinião é um vinho incrível) acabou com 84,50 na Bacco Ubriaco. Detalhe: pela nota média da confraria ficou próximo do Salton Talento 2002 que arrancou um 84,42 na média.
Minha opinião é bem diferente. O Montes Alpha revelou-se um vinho fora de série. O Talento 2002 já está envelhecendo. O Villa Francioni 2004 é ótimo em boca e o Lote 43 2004 foi o melhor nacional.
Confesso, inclusive, que mesmo tendo praparado a degustação estive às cegas com os vinhos. Não com o 2002, de fácil identificação pela idade, e com o Montes, tão diferenciado, mas entre os dois 2004 nem eu sabia o que estava provando.
O Montes Alpha vence os demais na relação preço-qualidade, mas concluo que não podemos continuar desprezando a priori a vinicultura brasileira.

SALTON TALENTO 2002
Desde que lançado em 2004 recebeu diversas citações e destaques. Foi medalhista na Vinitaly e foi alvo de especial interesse pelo sommelier italiano Enrico Bernardo em prova de nacionais. Jancis Robinson também destacou seu potencial de guarda. Carvalho francês por 12 meses.
Encontrei alo aquoso e decrescente, ficando mais rosado em direção à borda. Aromas de oliva, couro, herbáceo, claramente barrica francesa. Com o tempo em taça fica mais doce, revela baunilha. A fruta é ácida, morango.
Em boca é gostoso, um tanto tânico ainda. No início pega um pouco, mas evolui e melhora, adocica. Boa persistência e final correto, porém boca com algum desequilíbrio. BU 84,42. VV!85. R$67,00 na Cave del Rey.

VILLA FRANCIONI 2004
Um corte de uvas bordalesas: Cabernet Sauvignon 68%, Cabernet Franc 12%, Merlot 11% e Malbec 9%. Feito em Santa Catarina, de vinhedos em São Joaquim e Bom retiro, numa das regiões mais frias do país. É um dos nacionais preferidos do Saul Galvão, que lhe concedeu 89 pontos.
Para mim, cor ruby brilhante. Couro, tabaco, café e aquele aroma de cantina. Muito intenso, complexo. Perdeu pontos em qualidade aromática pela falta de equilíbrio entre madeira e fruta.
Corpo médio, interessante, muito correto. Excelente em boca, depois de um tempo chega a apresentar frescor. BU 83,12. VV!87. R$90,00 na Cave del Rey.

MIOLO LOTE 43 2004
Oriundo do Vale do Vinhedos, é um corte meio a meio de Cab. Sauv. e Merlot com as melhores uvas da vinícola. O nome é inspirado no primeiro lote de terras recebida pelo patriarca da família no Brasil. A Miolo considera que usa o conceito de "cru" e que este vinho suporta muitos anos de guarda. 70% descansou em carvalho americano e 30% em carvalho francês.
O site da produtora aconselha decantação de 1 a 3 horas antes de consumir. Foram produzidas 80.000 garrafas.Só é lançado em anos considerados excepcionais. Temos até agora 1999, 2002, 2004 e 2005.
Ruby escuro, brilhante, belo. Aroma muito bom, delicado, baunilha, floral, tabaco e geléia de fruta. Adorei o aroma. Elegante, sedutor, convida a beber. Boca delicada, macia, redonda, mas sem grandes qualidades. Com o tempo aparecem mais frutas e especiarias. Acidez um pouco exagerada. BU 82. WS 78. VV!88. R$80,00 na Cave del Rey.

MONTES ALPHA CABERNET SAUVIGNON 2005
Na verdade um corte de 90% Cab. Sauv. e 10% Merlot que pela legislação chilena pode rotular varietal. Este clássico passa por 12 meses de carvalho francês e foram produzidas 95.000 caixas.
Belo, brilhante. Aroma fantástico! Eucalipto, mentol. Evolui para especiarias e fruta mantendo o frescor. Complexo. Corpo ótimo, boca excelente. Frescor, mentol e taninos vivíssimos. Intenso e fresco. Delicioso. (A WS nomeia esse frescor como sendo grafite). BU 84,50. WS 89. VV!90. R$80,00 na Cave del Rey.

Um comentário:

Michael Genofre disse...

Parabéns pelo Blog, realmente inspirador e esclarecedor. O vinho nacional e a sua cruzada contra preconceitos então foram maravilhosos.

Indicarei seu blog em meu.

Abraços
Michael e Carol